24 julho 2020

A ameaça à Lei de Cotas

Apesar da Lei de Cotas, que completa 29 anos nesta sexta-feira (24), há pelo menos 
400 mil vagas para serem preenchidas por pessoas com deficiência e que não são



O governo federal enviou ao Congresso Nacional uma Medida Provisória com a qual tenta mudar para pior a Lei de Cotas, que completa 29 anos nesta sexta-feira (24). A iniciativa precisa ser barrada pelos representantes da população e o cidadão deve cobrá-los para que façam isto. 

A tentativa é alterar o artigo 93, o qual estabelece que empresas com cem ou mais funcionários destinem de 2% a 5% de suas vagas de trabalho a pessoas com deficiência ou beneficiários reabilitados, no sentido de atender jovens e adultos egressos do sistema de acolhimento. 

Se aprovada, a MP permitirá que as empresas optem por substituir a contratação de pessoas com deficiência e reabilitadas por jovens de 15 a 18 anos do sistema de acolhimento e por adultos de 18 a 29 anos egressos do mesmo sistema, que hoje não encontram trabalho. 

A proposta do governo é um retrocesso no que se refere ao alcance da Lei de Cotas, pois a exigência de contratação percentual de pessoas com deficiência ou reabilitadas é a principal razão hoje para que as empresas contratem esse tipo de mão de obra, em geral desprezada pelo mercado. 

Se não tiverem a obrigação, ainda que também não tenham simpatia pelos egressos do sistema de acolhimento, as empresas certamente vão preferir contratá-los a manter o processo atual, apenas para não terem de adaptar nenhuma área como hoje. 

É preciso lembrar que a situação das pessoas com deficiência e reabilitadas ainda não é boa mesmo com a lei. Neste momento, ainda há quase 400 mil vagas no país que deveriam estar ocupadas por essas pessoas, mas não estão por falta absoluta de fiscalização do governo. 

Há outro aspecto importante: com a pandemia provocada pelo novo coronavírus, a situação das pessoas com deficiência em idade de trabalhar ficou mais difícil. Muitas empresas não estão renovando o contrato ou não estão fazendo novos, gerando desemprego nesse setor. 

Só no Serviço Integrado de Reabilitação, Inclusão e Longevidade do Instituto Jô Clemente (antiga Apae de São Paulo), que insere pessoas com deficiência intelectual no mercado de trabalho desde 2013, pelo menos 440 novas inclusões previstas para este ano deixarão de acontecer. 

É claro que os projetos de inclusão de jovens do sistema de acolhimento são bem-vindos e necessários, mas não se pode despir um santo para vestir outro. É isto o que governo federal está fazendo com essa MP, em que pese a aura de boa intenção que apresentou aos congressistas. 

O último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizado em 2010, revela que há cerca de 45 milhões de pessoas com deficiência no país e desse total 31 milhões têm idade para ingressar no mercado de trabalho, além de reunirem condições para isso. 

Nesse cenário, é fundamental garantir a Lei de Cotas como vem sendo nesses 29 anos, ainda mais porque a Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) de 2018 já indicava que 441 mil pessoas com deficiência estão empregadas pela Lei de Cotas, mas outras 400 mil não. 

O Estado de São Paulo, que tem cerca de 140 mil profissionais com deficiência empregados, é o que tem o maior número de contratações do país. Em boa parte, essas contratações e o pleno desenvolvimento social dessas pessoas está garantido pela popularização da Lei de Cotas. 

O Serviço Integrado de Reabilitação, Inclusão e Longevidade do Instituto Jô Clemente implementou a metodologia do Emprego Apoiado em 2013 e já incluiu em São Paulo, por meio dela, mais de 2.500 pessoas com deficiência intelectual em empresas e órgãos públicos.