31 agosto 2020

Mentira é artifício de campanha

Há quase 40 anos, o saudoso Jornal da Tarde, do grupo Estado, publicava uma foto do então governador de São Paulo, Paulo Maluf (PP), com um enorme nariz de Pinóquio, em uma alusão ao personagem italiano que se tornou talvez o mais representativo de todos os tempos na crítica à prática da mentira nas suas mais diferentes formas. 

A capa histórica de março daquele ano marcava uma campanha feita pelo jornal para demonstrar, de forma lúdica, como o então governador mentia ao povo. Sob o título "Flagrante: nosso governador mentiu outra vez", a publicação revelava que Maluf escondia que ele havia definido o percentual de aumento dos servidores. 

Tanto tempo depois, praticamente toda a minha vida profissional, o que vemos hoje torna as mentiras do velho Maluf, que é um campeão na área sem dúvida, apenas uma coisa de amador, pois Jair Bolsonaro (sem partido) e João Dória (PSDB) ganham fácil em profundidade, número e condições de mentiras contadas para iludir o povo. 

Mas a população que fique alerta, pois a maioria das inverdades contadas por políticos ocorre exatamente nesta época de proximidade da eleição, ainda que nem o presidente da República e nem o governador sejam candidatos diretos, já que a eleição é só municipal, mas não se iludam, uma vez que um pleito prepara o outro. 

Bolsonaro está agindo nessa preparação para buscar a própria reeleição e usa de qualquer artifício para garantir que o caminho esteja livre. A maior das mentiras é que não recriaria a CPMF. Ela está aí pronta para ser escalada, mas com outro nome para dar a impressão de que cumpriu a promessa. Pior: ela volta para financiar a campanha. 

Outra mentira envolvendo a troca de nomes é o pacote de obras e benefícios que está apresentando como novo para dar a impressão de que faz alguma coisa pelo povo. Do total de 33 obras e benefícios, 25 já estavam no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) de Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (PMDB), aliás outra falácia. 

Não se entende por que o governo tem de criar um programa de aceleração se este programa não anda tanto quanto as obras normais. Na verdade, é uma jogada de marketing para colocar a luz onde se quer ver iluminado e deixar no escuro o que não se quer mostrar. Quando se fala em um programa para acelerar, se esquece do resto. 

O finado Mário Covas (PSDB) fez isto em São Paulo ao criar o Poupatempo, um serviço de excelência que substitui perfeitamente todas as funções das secretarias que prestam serviços diretos ao cidadão. Com isto, todo mundo esqueceu a ineficiência do Estado e passou a elogiar o governo por ter criado um serviço tão bom. 

João Dória também espera concorrer ao cargo de Bolsonaro e por isso já traçou sua estratégia. Eleito em 2018 na carona do presidente com o slogan BolsoDoria, ele tratou de se desvincular em 2019 e encontrou a chance ideal com a pandemia do novo coronavírus, ao defender o isolamento enquanto Bolsonaro prega o contrário. 

Só que também não mede as circunstâncias para buscar esse objetivo. Enquanto interessava ser oposição ao Palácio do Planalto, Dória segurou o retorno às atividades econômicas dentro da pandemia. Mas, ao ver que começava a prejudicar sua campanha, tratou de liberar tudo rapidamente ou transferir para os prefeitos liberarem. 

O que o eleitor não pode perder de vista é que toda mentira tem pernas curtas, mas desde que se consiga observar quando quem mente o está fazendo. Nem sempre isto é fácil, embora esteja-se cada vez mais abusando da capacidade de percepção. Enquanto o cidadão não focar nisso, vai continuar sendo enganado na cara dura. 

O melhor caminho para chegar lá é fugindo do exército de fake news criado por Bolsonaro e também não dando ouvidos às versões oficiais de fatos que não acontecem na prática como Dória faz. Isto ocorre em menor escala na cidade com prefeitos, vereadores e agora com candidatos a um e outro cargo nas eleições deste ano.