28 julho 2020

Os erros do STF e de Bolsonaro

Alexandre Moraes bloqueia contas em redes sociais de apoiadores de Bolsonaro prevendo
que eles vão atentar contra a ordem institucional: um erro, mas presidente também erra


O episódio envolvendo a decisão do ministro Alexandre Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), que mandou bloquear 16 contas de apoiadores de Jair Bolsonaro (sem partido), e a contraofensiva do presidente, determinando à Advocacia Geral da União que derrube a medida, mostra o quanto ambos usam dos seus cargos inadequadamente. 

O ministro não pode suspender contas de apoiadores do presidente sob a assertiva de que esses influenciadores, empresários e ativistas vão cometer ilícitos. Não pode afirmar que essas pessoas vão subverter a ordem institucional e promover a quebra da normalidade. Ele só pode julgar sobre o que aconteceu e não sobre o que pode. 

Do lado do presidente, ele também não pode utilizar a Advocacia Geral da União (AGU) para defender os seus interesses pessoais de proteger os apoiadores. Se o ministro do STF erra ao exorbitar na sua função e a AGU tem razão no que afirma sobre isto, Bolsonaro erra mais ao mostrar esse erro por meio dos advogados da União. 

Quem tem de se defender contra a decisão do ministro são os apoiadores atingidos: a líder de um grupo armado de extrema direita Sara Giromini, o blogueiro Allan dos Santos, o ex-deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e os empresários Luciano Hang, da Havan, e Edgar Corona, da rede de academias Smart Fit, que foram suspensos. 

As funções da AGU estão expressas claramente no artigo 131 da Constituição Federal: é a instituição que, diretamente ou através de órgão vinculado, representa a União, judicial e extrajudicialmente, cabendo-lhe, nos termos da lei complementar que dispuser sobre sua organização e funcionamento, as atividades de consultoria e assessoramento jurídico ao Poder Executivo. Só a ele. 

O grande problema dessas duas arbitrariedades é que elas jogam por terra as liberdades individuais, promovem o cerceamento da liberdade de expressão e beneficiam uma casta, que, se não é genuinamente bolsonarista, o é por afinidade de interesses, conceitos e doutrinas, o que é tão perverso quanto os atos de ditaduras mundo afora. 

O que se espera de representantes de uma Corte fundamental como é a do ministro Alexandre Moraes, é que aja com equidistância, buscando sempre o cumprimento da lei, como fez há 20 dias quando suspendeu 38 contas do instagram e 35 do facebook, além de 14 grupos, que pertenciam a usuários falsos. 

A diferença da ação naquela oportunidade e agora é que a suspensão visava eliminar contas falsas. Evidentemente, elas eram operadas por pessoas ligadas ao presidente Bolsonaro, mas elas não assumiam isto. Quando alguém participa do debate político com a sua cara, isto é legítimo e democrático, ainda que não se concorde com ele. 

Na decisão tomada na última sexta-feira (24), o ministro Alexandre Moraes atacou os mesmos alvos de 20 dias atrás, mas agora estabelecendo um posicionamento inadequado. Os apoiadores de Bolsonaro têm todo o direito de apoiá-lo e de defender suas ideias. Só não podem comprometer a ordem institucional e criar falsas informações. 

Se o ministro provar que isto aconteceu em alguma situação, aí sim deve puni-los com rigor. O que não pode é supor que vão fazer e suspender de antemão. Então quem é Bolsonaro não pode se manifestar? Errado, pode sim. Todos devem poder. Vê-se a mudança de postura do ministro quando aplica multa agora e não aplicava antes. 

Além disso, o ministro não determinou o impedimento de que as pessoas com contas suspensas na decisão de sexta-feira (24) pudessem abrir novas contas. Ora, se elas devem ser impedidas de subverter a ordem para não prejudicar a normalidade, por que podem abrir outras contas? A ação revela uma atitude política e não institucional. 

O que se perde com essa disputa patrocinada por atitudes como a do STF é o debate real sobre o que está acontecendo. Os apoiadores do presidente fazem campanha contra o combate ao coronavírus, porque é essa a condução que Bolsonaro dá. O que se tem de fazer é provar que isto está matando pessoas. Só isto. 

Historicamente, líderes políticos usam a população como massa de manobra para os seus interesses. Quando a população não pensa, age como um monstro sem cabeça. Quebra tudo em redor sem saber o porquê. O que é preciso é mostrar a esse mesmo povo o que ele pode fazer em seu benefício e não em benefício do líder a quem segue.